sexta-feira, 10 de julho de 2009

Cantoras lembram a importância de Elizeth Cardoso






Adriana Calcanhotto, Nana Caymmi, Wanderléa, Leny Andrade, Áurea Martins, Zezé Gonzaga, Cyva (Quarteto em Cy) e Alaíde Costa falam da cantora como artista e como pessoa
Rodrigo Faour e Nana Vaz de Castro
14/07/2000

Adriana Calcanhotto, Alaíde Costa, Elizeth Cardoso,Leny Andrade, Nana Caymmi,Quarteto em Cy, Wanderléa

Talento da Divina Elizeth merece caixa quádrupla

Elizeth Cardoso faz parte de uma linhagem de cantoras-intérpretes que, assim como Ângela Maria, Dalva de Oliveira, Carmen Miranda, Maysa e Maria Bethânia, viraram referências atemporais para todas as suas sucessoras, dentro da MPB. Afinada, elegante e cantando quase sempre o amor, ela marcou época com seu porte soberano. Contemporâneas ou de outras gerações mais recentes, cantoras de vários matizes – do samba-canção, da Jovem Guarda ao pop – todas respeitam muito a Divina.

"Admiro muito a persona dela, seu nível de entrega às músicas que cantava era maravilhoso. Era muito amorosa. Gosto especialmente dos discos em que ela cantava Vinicius", depõe Adriana Calcanhotto, especialista num estilo de interpretação mais cool. Num estilo de interpretação oposto ao de Adriana, a pioneira dos scats e do samba-jazz na MPB, Leny Andrade, atesta que "Elizeth é a única divina que nós temos". A cantora diz que quando é chamada de Divina no exterior, trata logo de corrigir o público. "Quando isso acontece tenho que explicar que divina foi Elizeth, pois ela era uma divindade que cantava".

Leny conta que, tal era a admiração, que foi a primeira a chegar ao velório de Elizeth, no Teatro João Caetano. "Eu a vi pela primeira vez quando tinha 16 anos, e ela cantava no Dancing Avenida, com a Orquestra Tabajara. Tive a sorte de ter bastante contato com ela. A carreira de Elizeth sempre foi um espelho, um modelo para mim. Ela era muito correta, nunca fez bobagem. Às vezes nos meus shows eu canto músicas de seu repertório, assim mesmo, sem ensaiar com os músicos, de surpresa, como Meiga Presença ou Canção da manhã feliz".

Da verve mais emocionada de interpretação, mais próxima à de Elizeth, Alaíde Costa diz que a cantora era muito generosa, muito bondosa. Ela a conheceu na Rádio Nacional. Depois, participou do programa Bossaudade, que Elizeth apresentava na TV Record, ao lado do Cyro Monteiro. Em seguida, mudou-se para São Paulo e ficou um pouco mais afastada da cantora. Um dia, teve uma grata revelação, via TV. "Fiquei muito surpresa quando, numa entrevista, perguntaram quem indicaria para substituí-la e ela disse: Áurea Martins e Alaíde Costa".

Egressa da Jovem Guarda, Wanderléa diz que sempre admirou Elizeth. "É a primeira dama da canção brasileira. Cantava suas músicas quando era pequena. Adoro Canção de Amor. Tive contato com ela no início da minha carreira, quando a TV Record tinha aquela coisa bonita de ter vários matizes de programação, tanto da ala jovem, quando da velha guarda. Elizeth tinha uma personalidade forte, era bonita, íntegra. Muito elegante. Nunca teve nenhum tipo de ranço com a nossa turma", frisa.

Contemporânea de Wanderléa, mas do lado da bossa nova, Cyva, do Quarteto em Cy, diz que trabalhou com Elizeth no espetáculo O Rio Amanheceu Cantando, com músicas de Braguinha, ao lado do MPB-4 e de Sidney Magal, dirigido por Carlos Machado, em 1975. "Na época ela já era uma superestrela, e nós éramos relativamente novatos, mas ela tratava a todos como iguais, com o maior carinho. Era uma pessoa muito generosa, doce, não tinha arrogância nem estrelismos, além de, claro, ser uma cantora excepcional. Quando ela entrava no palco, com sua voz privilegiada, encantava a todos, com seu porte de rainha", relata. Cyva lembra que no princípio da carreira do Quarteto, o LP Canção do Amor Demais era um disco que não saía da vitrola das suas integrantes. "Foi com ela que conhecemos e aprendemos as músicas de Tom e Vinicius", lembra.

Generosa, maternal e divertida
Cantoras românticas confessas, Áurea Martins e Zezé Gonzaga tiveram contato com Elizeth nos últimos anos de vida. Áurea diz que a Divina certa vez a encheu de comida. "Uma vez ela achou que eu estava muito magra, me levou para tomar café da manhã com ela e tratou de botar Sustagem para eu comer. Ela era meio mãezona mesmo", ri. Já Zezé revela um lado menos conhecido da amiga. "Além de generosa, era uma pessoa alegre apesar de cantar um repertório mais dolente, de dor-de-cotovelo. Gostava de uma piadinha, de brincar".

Quando Elizeth voltou de sua turnê do Japão, já estava doente. O tratamento contra o câncer teve êxito em um primeiro momento. Emocionada com sua recuperação, Zezé mandou celebrar uma missa em sua homenagem. "Qual foi minha surpresa, quando estava chegando na igreja, Elizeth estava lá. Eu disse: ‘Mas não era para você vir, era uma missa em ação de graças’. E ela respondeu: ‘Mas você acha que eu não viria?’ Daí para frente, ligava para ela, ia à casa dela e ficamos mais amigas", relata.

Nana Caymmi também é só elogios não só para a cantora mas também para a pessoa de Elizeth. "Ela acreditou em si mesma, no seu trabalho, na MPB. Era uma mulher de grande sensibilidade, que investiu em muitos compositores novos. Acreditou na MPB. Até muitos músicos que estão aí, estão comendo e bebendo hoje graças a ela. Uma das minhas escolas é Elizeth!", elogia. Nana sublinha ainda sua generosidade. "Na época que meu filho João Gilberto ficou no CTI, ela me ajudou muito. Ia me visitar na Clínica São Vicente, já com câncer, me dar conforto". A cantora ressalta que como intérprete não vai haver outra igual a Elizeth e dispara uma de suas farpas certeiras: "Ela teria vergonha das cantoras que surgem agora (risos). Porque ela é da geração das intérpretes".

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